#03 | Qual é o preço do corpo perfeito?
Será que o problema realmente está naquela fatia de bolo que você comeu na semana passada? Vem entender.
Recentemente, em uma das minhas idas ao mercado, me deparei com uma variedade de produtos proteicos, como picolé, cappuccino e até chocolate — citando apenas alguns porque a lista é grande. Isso me levou a uma reflexão nova: quando abandonamos as “comidas de verdade” e voltamos a optar pelo industrializado?
Sempre que escrevo algum texto busco informações nos meus materiais de estudo e, logo me lembrei de um trecho do livro A Formação da Culinária Brasileira, escrito pelo sociólogo Carlos Alberto Dória:
“Cada garfada está envolta naquilo que um jornalista norte-americano chamou de ‘conspiração da complexidade científica’; isto é, praticamente tudo o que consumimos foi produzido por uma poderosa máquina que, nos EUA, movimenta 32 bilhões de dólares em marketing e traz à luz, anualmente, cerca de 17 mil novos produtos, orientados pela confusa ideologia do nutricionismo”.
Assim como as outras artes, a gastronomia também é afetada pelas tendências sociais. Se você é um usuário de redes sociais, certamente já percebeu a volta dos corpos fortes, definidos e magros como o novo padrão, substituindo a magreza das super modelos que nós, da geração Z, crescemos vendo em revistas adolescentes.
Para Carlos Dória, esse consumo desenfreado de produtos industrializados pode ainda resultar no desaparecimento de cozinhas como as nacionais, uma vez que estas não seguem essa ideologia nutricionista.
É fato que, sim, a proteína exerce um papel importante no nosso corpo, atuando na formação dos tecidos e na produção de anticorpos. Estudos sugerem que indivíduos que praticam atividade física moderada ingiram de 1,2 a 1,4 g de proteína por dia (quantidade que varia conforme o peso corporal). Provavelmente, se você é como eu (que treina fofo), consegue atingir essas medidas somente com a alimentação. A suplementação é recomendada principalmente para atletas profissionais e aqueles que praticam atividades físicas intensas — do tipo que você sente que o coração vai sair pela boca a qualquer momento.
O problema começa quando, ao invés de profissionais, nos consultamos com influencers fitness que, sinto dizer, possivelmente não atingiram aquele tão sonhado corpo naturalmente. Ao substituirmos alimentos naturais por estes enriquecidos de proteínas, não estamos apenas perdendo o prazer de comer um bom prato, mas também colocando nossa vida em risco. Isso mesmo!!! A ingestão exagerada de proteína pode causar aterosclerose — nome difícil para o acúmulo de gordura e outras substâncias nas artérias, podendo resultar em doenças cardiovasculares.
Em suma, podemos dizer que essa nova onda fitness demonizou o biscoito recheado e o achocolatado de caixinha para consumir os mesmos produtos em uma embalagem bonitinha com um selo de +proteína.
Em um estudo realizado pela universidade espanhola Miguel Hernández de Elche (UMH), analisaram-se as tabelas nutricionais de 4.325 desses produtos e o resultado surpreendeu: 91% deles foram considerados não saudáveis, uma vez que grande parte das amostras possuía altas quantidades de gordura saturada, sal, açúcares e/ou corantes. Basicamente, estamos colocando nosso corpo em risco para atingir o corpo definido como ideal.
Numa sociedade em que o tempo de lazer não é uma de nossas prioridades (obrigada, capitalismo!!!), precisamos escolher entre utilizar as horas de descanso para de fato relaxar ou para atividades como cozinhar — isso sem falar na alta dos produtos de qualidade, cada dia mais inacessíveis. Portanto, é sim compreensível essas substituições que, ainda que inconscientes, condizem com o estilo de vida imposto à grande parte da sociedade.
Para não ser hipócrita: sim, diariamente tomo minha creatina e minha vitamina com whey. Não espero que com esse texto você remova todos esses industrializados da sua geladeira. Espero que tenhamos mais conhecimento sobre o que estamos consumindo e o que, de fato, nos é benéfico. Faça exercícios, coma seu docinho no final de semana e, principalmente, não se cobre tanto, afinal, a moda é passageira e sua saúde é pra toda a vida.
Até a próxima! :)